quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

escrever

começo a escrever com a força de um vômito que quer sair e que não consegue e de repente explode. a imagem é feia e eu sei que é porque sei também que é feia a ausência de tempo para escrever, para estar sozinha, para conseguir estar sozinha e ter tempo e energia e vontade e coragem de escrever. é tão difícil quanto enfrentar o vômito e entender que às vezes mesmo sendo ruim e ficando o gosto amargo na boca é melhor isso do que aquela sensação permanente de passar mal, de comida estragada no sistema digestivo.

escrevo assim sim porque faz quase um mês que eu não escrevo e isso me consome e me mata por dentro. porque não escrever para mim é quase como não existir. é não conseguir entender o que acontece comigo, é não dizer para os outros o que eu penso. e o sentimento fica ali represado, acumulando, dentro de mim. porque foram - os últimos 30 dias - dias tão intensos, de tanta correria, de tanto trabalho e tanta tarefa que eu nem lembrava mais meu nome, não sabia mais quem eu era.

isso embrutece. quando a gente esquece da gente mesma e trabalha tanto que não tem tempo nem de dormir nem de comer direito nem de respirar com calma nem de transar nem de paquerar nem de ver amigos nem de se divertir nem de escrever. e aí a gente se perde e se some.

mas olha que eu não estou reclamando do meu trabalho não. sou muito feliz por trabalhar construindo coisas nas quais eu acredito. mas falta a medida. falta saber colocar limite. porque a gente não pode se perder no trabalho. porque quando a gente se perde, a gente perde a capacidade de encontrar o outro. e eu sei que tenho essa mania. essa relação de dependente químico com o trabalho. de me enterrar no trabalho para fugir de todo o resto. para não ter que lidar comigo mesma.

e pior. sei que nesse processo, na ausência de mim, também é ausência de carinho e de cuidado com os processos e as pessoas. é um processo em que tudo é tão importante e tão urgente que a gente perde a mão. que a gente é bruta sem querer. que a gente entra num parafuso.

não sei exatamente porque escrevo sobre isso, dessa maneira destrambelhada, confusa, sensacionalista e de peito aberto assim de coração aberto assim como um livro aberto sem esconder nada. mas essencialmente o que eu preciso escrever, e deixar bem claro e bem explícito e bem forte pra mim é que ou eu arranjo tempo para mim, ou eu não consigo existir. ou eu priorizo cuidado e carinho para as pessoas de quem eu gosto ou eu não vou conseguir construir relações com substância.

talvez esse texto seja apenas para dizer: escreva, lira, escreva. arrume tempo para escrever. (e aí também arrume tempo para dormir, para descansar, para comer sem pressa, para ler, para ouvir um som). mas escreva, e não pare de escrever porque só assim você consegue respirar, consegue sobreviver, consegue ser uma pessoa mais humana. não se adapte à correria da cidade de são paulo que desumaniza tanto as pessoas. consiga tempo. furte tempo se for necessário. mas escreva. porque escrever é preciso para não se afogar de si mesma.

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